Preparamos uma lista de treze obras da literatura gótica e de horror consideradas imperdíveis não só por quem é amante do gênero, mas também por especialistas do assunto
A maioria de nós não é fã de sextas-feiras 13. O “dia oficial” do azar costuma nos deixar em estado de alerta, e até quem não é muito supersticioso evita passar embaixo de escadas, cruzar com gatos pretos, não deixar tesoura aberta, e por aí vai. Há também quem resgate, do fundo das gavetas, os crucifixos, os patuás e as fitas, que carregam para afastar os maus agouros trazidos pela data.
Em todo caso, para não correr riscos, é melhor você permanecer na segurança do lar. E para que você fique em companhia apropriada, preparamos uma lista de treze obras da literatura gótica e de horror consideradas imperdíveis. Não só por quem é amante do gênero, mas também por especialistas do assunto.
Seguindo uma cronologia histórica, os livros foram selecionados pelos participantes do grupo “Seminários Góticos” — pesquisadores, escritores, editores, tradutores e aficionados em geral que encontram-se periodicamente no Sebo Clepsidra, em São Paulo, que tem valioso acervo de literaturas noturnas.
1) O Castelo de Otranto - Horace Walpole
Hoje, é consenso que o inglês Horace Walpole e de seu “O Castelo de Otranto – Um Romance Gótico” (1764) tenha praticamente inaugurado a literatura gótica e todas as correntes sobrenaturais que dela derivaram.
Ambientação medieval, castelos assombrados, calabouços gotejantes, esqueletos que voltam à vida… O livro é um verdadeiro inventário dos elementos que, até hoje, são utilizados para se construir uma história de horror.
2) Os Mistérios de Udolpho - Ann Radcliffe
Walpole pode ter inaugurado a literatura gótica, mas coube aos autores seguintes aprimorá-la. Em especial, à também britânica Ann Radcliffe, que tornou-se o mais famoso nome do gótico a partir dos anos 1790.
Sua grande obra é “Os mistérios de Udolpho”, de 1794. O livro relata a trágica história da jovem Emily St. Aubert, que, após a morte da mãe, parte em viagem com o pai pelo sul da França. É um prato cheio para nós, aficionados pelo horror gótico: repleto de incidentes e reviravoltas, passagens de profundo horror físico e psicológico, cenários desoladores, castelos remotos e arruinados e, claro, um vilão impenetrável e intrigante.
3) O Monge - Matthew Gregory Lewis
Romance da primeira fase da literatura gótica, que rapidamente tornou-se um clássico do gênero. Nele, lemos a história do monge Ambrósio, que é exemplo de virtude e de conduta para seus colegas.
Porém, o diabo está à espreita. E quando o noviço de quem o monge Ambrósio cuida revela ser uma mulher, o protagonista cai em todas as tentações possíveis.
Quando foi lançado em 1796, O Monge causou ultraje e fascinação. Os mais conservadores ficaram chocados com a publicação de uma história contendo blasfêmias, sequestro, assassinatos, incesto, cadáveres em decomposição e uma adoração ao diabo sem precedentes — em outras palavras, um livro imperdível.
4) O Homem da Areia - E.T.A. Hoffmann
Os ingleses faziam sucesso, mas foi um alemão que inseriu, nos relatos sobrenaturais, um componente até hoje revolucionário: o psicológico. Falamos do autor, pintor, jurista e músico Ernst Theodor Amadeus Hoffmann, ou E.T.A. Hoffmann.
Como todo grande escritor, Hoffmann foi visionário ao combinar tradição e modernidade. Seu conto “O Homem da Areia”, por exemplo: publicado em meados de 1816 (quase um século antes de Freud e da psicanálise), explora as regiões escuras da mente do protagonista, Natanael.
O que as cartas relatam é verdade ou delírio? Natanael está louco ou é realmente acossado pela figura demoníaca do homem de areia? Abordando o conceito de “duplo” e explorando possíveis alucinações, Hoffmann estabelece novas diretrizes para as narrativas sinistras.
A leitura de Manfredo é memorável não apenas pelo teor “fáustico” da história, mas pelas caracterizações sublimes das paisagens alpinas e, principalmente, pelas reflexões de cunho existencial (que impactaram pensadores da magnitude de Nietzsche). Tudo envolto pelas brumas do sobrenatural.
6) Frankenstein - Mary Shelley
Tanto já se falou e fala deste clássico absoluto — considerado também a pedra fundamental da ficção científica —, que qualquer apresentação será insuficiente, ou redundante.
Basta dizer que, em 2018, quando completam-se 200 anos da publicação da britânica Mary Wollstonecraft Shelley, Frankenstein, ou o Prometeu moderno permanece como uma das maiores obras literárias de que se tem notícia.
Até hoje reverberam os trovões da “noite pavorosa de novembro”, quando Prometeu — ou melhor, Victor conclui seu trabalho e, por meio de uma combinação entre matemática e alquimia, insufla a vida na remendada criatura que tem diante de si (na versão revisada de 1831, Mary Shelley alterou esse método para a eletricidade).
7) Contos de Edgar Allan Poe
Entre os especialistas, é consenso que ninguém tenha feito tanto pelas histórias de horror como o estadunidense Edgar Allan Poe. Para entender o porquê, basta conhecer os contos da antologia Tales of the Grotesque and the Arabesque (1840) — no Brasil conhecida como as Histórias Extraordinárias. Em cada um dos relatos, Poe soube explorar com maestria aquele fascínio que o desconhecido sempre exerceu sobre nós.
Tem de tudo. A tradição gótica (marcante em relatos como "A Queda da Casa de Usher", “O Poço e o Pêndulo” e “Ligéia”); as “inovações tecnológicas” da época (como a hipnose em “Os Fatos no Caso do Senhor Valdemar”), a crueldade (“O Gato Preto” — perfeito para a sexta 13! — e “O Barril de Amontillado”) e, claro, o horror sobrenatural (em “A Máscara da Morte Rubra” e “O Coração Delator, por exemplo”).
Poe descobriu novos e poderosos jeitos de assustar os leitores. Tanto é que frequentou – e frequenta – a cabeceira de dez entre dez dos grandes que vieram a seguir.
Com uma trama envolvente e uma narrativa carregada de tensão, Le Fanu, de certa forma, aplainou o caminho para o titã que, 25 anos depois, transformou-se naquela que provavelmente é a mais famosa história de horror de todos os tempos:
9) Drácula - Bram Stoker
Assim como Frankenstein, Drácula continua soberano 121 anos depois de seu lançamento (1897). São vários os motivos que justificam a imortalidade da história e do personagem.
Entre eles, está a habilidosa exploração, por parte do autor, da narrativa epistolar, recurso retórico que começava a surgir. Ou seja, a história contada por meio de cartas e de atualizações em diários, de notícias de jornais, de documentos náuticos etc. O formato fortalece uma característica indispensável para qualquer narrativa de teor sobrenatural: a verossimilhança.
A atmosfera é outro grande triunfo de Bram Stoker. Até hoje, leitores e críticos concordam que a ambiência carregada de Drácula funciona, e muito bem. O cuidado do autor na criação de cenários sinistros e o tom pesaroso com que ele relata a história acentuam o efeito do horror, provocando nos leitores uma tensão que permanece vibrante até hoje.
Qual história? A de uma jovem governanta que vai cuidar de um casal de crianças em uma mansão, após os empregados anteriores terem desaparecido misteriosamente.
O clima pesado e labiríntico da narrativa de James, mestre absoluto no manuseio da ambiguidade e na exploração psicológica de seus personagens, são o grande destaque. Quanto a nós, leitores, vemo-nos desamparados entre vivos que se vão, mortos que voltam e, claro, crianças assustadoras.
11) Nas Montanhas da Loucura - H.P. Lovecraft
Uma das narrativas mais extensas do norte-americano H.P. Lovecraft e publicada em 1936, Nas montanhas da loucura costuma dividir opiniões. Muitos fãs consideram a obra — que traz a história de uma expedição à Antártica em que são descobertos vestígios de uma civilização remota — excessivamente longa, carente de uma edição mais rigorosa.
Já outros tantos (incluindo-se aí o autor desta lista) veem, no texto, o mais poderoso exemplar da estética do horror cósmico, da qual Lovecraft é o maior expoente. A nosso ver, a força da literatura lovecraftiana vem do estímulo à imaginação por meio da sugestão, de vislumbres da grandiosidade e do inominável. E, em Nas montanhas da loucura, estas operações acumulam-se, tornam-se mais e mais intensas — intensificando-se, desta forma, as reações causadas no leitor.
12) Livros de sangue - Clive Barker
Um dos maiores nomes do horror e da fantasia atuais, o britânico Clive Barker tornou-se mundialmente famoso por Hellraiser, filme que dirigiu baseado em sua própria obra, The hellbound heart (1986). No entanto, acreditamos que a série "Livros de sangue" condensa o que o autor tem de melhor a oferecer aos amantes do gênero.
Distribuída entre seis volumes (publicados entre 1984 e 1985), a série foi muito bem sucedida, ficando entre os best-sellers britânicos da época. Pudera: histórias como Nas Montanhas, As Cidades, O Trem de Carne da Meia-noite, O Filho de Celulóide e Jacqueline Ess: Sua Vontade e seu Testamento, entre outras, já revelavam uma impressionante exuberância criativa.
Explorando temáticas diferentes, Barker nos convida a gravitar entre o sublime e o ofensivo, entre o irresistível e o medonho. Nos “Livros de Sangue”, também já observamos uma operação que se tornaria marca distintiva do autor: o uso de seduções das mais diversas naturezas (muitas vezes sexuais, é verdade) como isca, enquanto a clava dos horrores permanece engenhosamente oculta até descer com força sobre o juízo das personagens — e sobre o nosso, claro.
13) A coisa - Stephen King
Ao maior nome do horror atual, nada mais justo do que reservar o lugar de honra de nossa agourenta lista. Poderíamos sugerir inúmeros títulos de King; mas, aproveitando ainda o sucesso da adaptação cinematográfica do ano passado (e no aguardo da sequência), vamos de It.
Há muitos pontos a serem destacados na história de Pennywise, o palhaço-entidade que, a cada 27 anos, aparece em uma cidadezinha do Maine (EUA) trazendo uma onda de assassinatos macabros.
Antes mesmo de começarmos a leitura, já nos assustamos: afinal, trata-se de um catatau de 1.100 páginas. Mas é uma aventura inesquecível. Há muitos cliffhangers (não sabe o que significa esse termo? ) que nos grudam à história, e as personagens são magnificamente construídas.
Last, but not least: estamos falando de Stephen King, um prosador de primeira categoria. A história é tão bem contada que nos sentimos dentro da pequena cidade de Derry, onde tudo acontece. E nos sentimos perigosamente à mercê do palhaço mais assustador da literatura — e do cinema.
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